sábado, 31 de março de 2012

Pesquisa Qualitativa e Interesses do Conhecimento


Florianópolis, 13 de abril de 2011.

Universidade Federal de Santa Catarina.

Oliveiros Dias Jr.

Grupo de Pesquisas em Educação em Saúde.

Pesquisa Qualitativa
e Interesses do Conhecimento.

Muito se discute sobre pesquisa qualitativa e, ou quantitativa, fazendo-se comparações que muitas vezes não levam a lugar algum.  Bauer e Gaskell (2002) afirmam haver muita confusão metodológica nessa comparação, confundindo coleta e análise de dados com princípios do delineamento da pesquisa e interesses do conhecimento. Estes mesmos autores sugerem que a escolha entre quantitativa ou qualitativa é prioritariamente uma decisão sobre a geração de dados e os métodos de análise e, secundariamente pode ser uma escolha entre o delineamento da pesquisa ou de interesses do conhecimento.

Alguns pontos são apontados como importantes a serem lembrados num trabalho de pesquisa científica (Bauer e Gaskell, 2002):
- não há quantificação sem qualificação (ou categorização);
- não há análise estatística sem interpretação;
- o pluralismo metodológico dentro do processo de pesquisa vai além da lei do instrumento;
- a ordenação no tempo - previsão, levantamento, análise, interpretação (de dados) e comunicação dos resultados;
- um discurso independente dos “padrões de boa prática”;
- cuidar da retórica observando o logos, o pathos e o ethos da persuasão (Leach apud Bauer e Gaskell, 2002), lembrando que os métodos e os procedimentos são o meio científico de prestação pública de contas com relação à evidência (Habermas apud Bauer e Gaskell, 2002);
- interesses do conhecimento e métodos (Habermas, 1987);
- a autenticação, a crítica e a possibilidade de uma ação emancipatória.

Quando se domina muito uma ferramenta (ou instrumento) é tendência a utilizar a mesma ferramenta para resolver problemas de ordens diversas, essa é a lei do instrumento, que deve ser transcendida pelo pesquisador.

Afirmações como “explicamos a natureza, compreendemos a vida mental”(Dilthey apud Günter, 2006) e que “métodos quantitativos e qualitativos são mais que diferentes estratégias de pesquisa e coleta de dados, mas, que representam, fundamentalmente diferentes referenciais epistemológicos para teorizar a natureza do conhecimento” (Filstead apud Bauer e Gaskell, 2002) estão nas origens da discussão entre as abordagens qualitativa e quantitativa, discussão essa considerada infrutífera.

Sobre os critérios de qualidade de pesquisa, para Günther (2006) a abordagem qualitativa, por ser mais recente, ainda carece de critérios bem claros e delineados. Agregando as considerações de vários outros pesquisadores - Grunenberg, Mayring, Miles e Huberman e Steinke - Günther formulou critérios de qualidade para a pesquisa qualitativa sob forma de perguntas:

- As perguntas da pesquisa são claramente formuladas?
- O delineamento da pesquisa é consistente com o objetivo e as perguntas?
- Os paradigmas e os construtos analíticos foram bem explicitados?
- A posição teórica e as expectativas do pesquisador foram explicitadas?
- Adotaram-se regras explícitas nos procedimentos metodológicos?
- Os procedimentos metodológicos são bem documentados?
- Adotaram-se regras explícitas nos procedimentos analíticos?
- Os procedimentos analíticos são bem documentados?
- Os dados foram coletados em todos os contextos, tempos e pessoas sugeridos pelo delineamento?
- O detalhamento da análise leva em conta resultados não-esperados e contrários ao esperado?
- A discussão dos resultados leva em conta possíveis alternativas de interpretação?
- Os resultados são - ou não - congruentes com as expectativas teóricas?
- Explicitou-se a teoria que pode ser derivada dos dados e utilizada em outros contextos?
- Os resultados são acessíveis, tanto para a comunidade acadêmica quanto para os usuários no campo?
- Os resultados estimulam ações - básicas e aplicadas futuras?


Günther (2006) afirma que um pesquisador classificado como quantitativo dificilmente exclui o interesse em compreender as relações complexas e que, tal compreensão é por meio de explicações ou compreensões das relações entre variáveis. O mesmo autor aponta que, “sem dúvida, pode-se conceber as múltiplas atividades que compõem o processo de pesquisa como um ato social de construção de conhecimento”, apontando para outra questão mais importante ainda a ser respondida: “qual a correspondência entre o conhecimento socialmente construído e a realidade alheia?”, ainda supondo aqui a possibilidade que ela existea independentemente do pesquisador. Flick e cols (apud Günther, 2006) apontam a primazia da compreensão como princípio do conhecimento e que a pesquisa é percebida como um ato subjetivo de contrução. Sendo assim, Günther (2006) coloca em dúvida se realmente, na pesquisa quantitativa, crenças e valores pessoais não são consideradas fontes de influência no processo científico.

Neves (1996) afirma que o arcabouço de interpretação empregado pelo pesquisador, que lhe serve de visão de mundo e de referencial determina o vínculo entre signo e significado, conhecimento e fenômeno e serve para estabelecer caminhos de pesquisa de tal forma que os esforços de cunho qualitativo e quantitativo podem se complementar, onde uma mistura de procedimentos de cunho racional e intuitivo são capazes de contribuir para uma melhor compreensão dos fenômenos. Citando Pope & Mays, Neves (1996) afirma ser possível a distinção entre os enfoques qualitativo e quantitativo, mas não seria correto afirmar que guardam uma relação de oposição. Segundo Neves (1996) a combinação das técnicas quantitativas e qualitativas torna uma pesquisa mais forte. Esta combinação recebeu diversos nomes: triangulação (Jick apud Neves, 1996); validação convergente ou multimétodo (Fiske apud Neves, 1996); triangulação simultânea e triangulação seqüenciada (Morse apud Neves, 1996).

O ideal científico que descreve e explica a natureza sem a utilização de uma retórica adequada, é cada vez mais desafiado pela visão da realidade presente na comunicação no meio dos cientistas e entre estes e o público. O dever da ciência tem obscurecido o ser da ciência. A comunicação é um processo essencial da atividade científica e isto implica na persuação dos ouvintes. Leach (apud Bauer e Gaskell, 2002) através da análise retórica aponta a base da persuação em três pontos - o logos, o pathos e o ethos. O logos se refere à pura lógica do argumento em suas várias formas. O pathos refere-se às formas de apelo e o reconhecimento dado à audiência considerando-se a psicologia social das emoções.O ethos trata das referências explícitas e implícitas na situação de quem fala, que estabelece a credibilidade e a legitimidade no falar o que está sendo dito. Convencer os pares, as agências financiadoras, o público sobre os resultados da pesquisa sempre envolve esse tripé da persuasão, seria ingênuo se pensar que simplesmente ideal científico, o logos, o argumento sejam suficientes sem o pathos e o ethos.  

Há muito se discute sobre os objetivos e resultados da pesquisa assim como os interesses reais por detrás da mesma, se puramente o conhecimento, o controle ou a emancipação social. Refletir sobre tais temas é essencial para uma crítica à própria ciência que se faz. Sempre se coloca a pesquisa quantitativa a serviço do controle e a pesquisa qualitativa, que dá voz às pessoas como emancipatória, uma dicotomia, mais uma vez, não verdadeira nem de alguma utilidade. Bauer e Gaskell (2002) vão referir-se à filosofia de Jürgen Habermas apresentada em Knowledge and Human Interests (Conhecimento e Interesses Humanos, 1987), daqui pra frente referida somente como Habermas.

Habermas identifica três “interesses do conhecimento”, compreendê-los dá sentido à prática da ciência social e das suas conseqüencias para a sociedade. A chave para tal compreensão, ao contrário do que se pensa, não está nas orientações intencionais e epistemologicamentes conscientes dos cientistas, os interesses do conhecimento estão antropologicamente sedimentados. Argumenta que desde Kant, “constrói-se o próprio caminho sobre estágios abandonados de reflexão”, com o predomínio do positivismo, a filosofia não compreende a ciência, já que a própria ciência se constituiu como a única forma de conhecimento que o positivismo admite como crítica, algo como o falsificacionismo de Popper. Faz-se necessária uma auto-reflexão crítica, pela qual a ciência pode se tornar capaz de autocompreensão (não-cientística), sendo capaz de revelar as condições que possam impedir uma prática de pequisa crítica e emancipatória. Os três constitutivos do conhecimento, segundo Habermas, estão na base das ciências “empírico-analíticas”, histórico-hermenêuticas” e “críticas”.

As ciências “empírico-analíticas”, se relacionam com a luta perpétua para o controle do mundo natural, ou seja, têm o interesse no controle técnico, procurando produzir conhecimento nomológico. É um modelo que pode ser visto em muita pesquisa social quantitativa.

As ciências histórico-hermenêuticas vêm de um interesse prático no estabelecimento do consenso, sendo imperativo a compreensão intersubjetiva fidedigna. A Verstehen (compreensão hermenêutica) visa restaruar canais rompidos de comunicação. Num primeiro nível, a comunicação entre a experiência de um indivíduo e a tradição à qual ele pertence. Num segundo nível da esfera de comunicação, acontece entre os diferentes indivíduos, grupos e tradições. Sendo a falta de comunicação um problema perpétuo e onipresente no mundo social, restabelecer esta comunicação também se torna um problema da mesma ordem. O consenso é fluido e dinâmico, conseguido através de uma interpretação que evolui historicamente, orientada a apreender a realidade social que constitui o “interesse prático” das ciências hermenêuticas - “cuja finalidade (não dita) é estabelecer as normas comuns que tornam a atividade social possível”. Habermas afirma que

“uma crítica bem-sucedida é a que explica os fenômenos sob investigação com mais sucesso do que as teorias aceitas até o momento. E ao fazer isto, ela deve desafiar pressupostos que até o momento tinham sido aceitos acriticamente.”

Assim, ao assumir-se um enfoque qualitativo, seja fenomenológico, socioconstrucionista ou qualquer outro, corre-se o risco de substituir-se acriticamente os próprios pressupostos pelos dos informantes.

Os interesses emancipatórios das chamadas “ciências críticas” por Habermas, não exclui mas transcende as ciências empírico-analíticas ou as de entendimento hermenêutico. Os interesses emancipatórios fornecem o referencial para ir além do conhecimento nomológico e das Verstehen, sendo

“através de um processo auto-reflexivo que as ciências críticas podem chegar a identividar estruturas condicionadoras de poder que, acriticamente se mostram como “naturais” mas são, de fato, o resultado de uma “comunicação sistematicamente distorcida e de uma repressão sutilmente legitimada”

Como afirmam Bauer e Gaskell (2002), mais importante que a escolha da técnica empregada, a prontidão dos pesquisadores em questionar seus próprios pressupostos e as interpretações subseqüentes de acordo com os dados, juntamente com o modo como os resultados são recebidos e por quem são recebidos, são fatores muito mais importantes para uma ação emancipatória. Igualmente Pereira (1999), alerta que ao assumir premissas, o que é inerente à estrutura do conhecimento científico, condiciona o entendimento do real, repensá-las auxiliam a concepção das estratégias de investigação; distinguir entre ser e atributo, objeto da filosofia, constitui-se em elemento importante para que o pesquisador defina a delimitação do seu objeto de estudo.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

Bauer, M.W.; Gaskell, G.; Allum, N.C.(2002). Qualidade, quantidade e interesses do conhecimento: Evitando confusões. Em: M.W.Bauer; G.Gaskell (Eds). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: Um manual prático. (pp. 17-36). Petrópolis: Vozes.

Günther, Hartmut. Pesquisa qualitativa versus pesquisa quantitativa: esta é a questão?. Psic.: Teor. e Pesq., Ago 2006, vol.22, no.2, p.201-209.

Neves, J.L. (1996). Pesquisa qualitativa - características, usos e possibilidades. Caderno de Pesquisas em Administração. São Paulo,1996, v.1, n.3, 2o.sem.

Pereira, J.C.R. (1999)l. O dado qualitativo. Em:______. Análise de dados qualitativos: Estratégias metodológicas para as Ciências da Saúde, Humanas e Sociais. (21-42). São Paulo: Editora Universitária.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Tai Chi Chuan & Wudang Chi Kung


 

AULAS DE TAI CHI CHUAN E CHI KUNG

UFSC 2013

(Eucaliptos do Bosque do CFH / Centro de Convivência):


AVISO IMPORTANTE

As turmas estão sendo formadas. 
3as feiras (horário a resolver)
5as feiras das 15 as 16h.

Estão previstas atividades extra-classe
 (caminhadas nos finais de semana e
 seminários sobre filosofias do oriente)


Praia da Armação :

Domingos nas Campanhas da Armação (a combinar).

(ilhota entre as praias da Armação e Matadeiro)

Se vocêm tem interesse em aulas particulares ou em grupo, coloque suas sugestões aqui ou mande por email.

Primeira aula grátis.

OLIVEIROS.


48 9977 1922